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sábado, 7 de janeiro de 2012

Irã e o cerco estratégico da Síria e o Líbano


Por Mahdi Darius Nazemroaya

O cerco da Síria e do Líbano está planejado faz tempo. Washington e a OTAN começaram em 2001 o processo para isolar mediante um anel de segurança o Líbano e a Síria. A presença permanente da OTAN no Mediterrâneo oriental e a Lei de Responsabilização da Síria fazem parte desta iniciativa. Parece que este roteiro se baseia em um documento israelense de 1996 orientado para controlar a Síria. O nome do documento é "Uma ruptura definitiva: Uma nova estratégia para garantir a segurança do reino de Israel".

O documento israelense, que inclui como autores destacadas personalidades da política estadunidense, diz que se "faça retroceder a Síria" no ano 2000 ou depois. O roteiro propõe que se faça sair os sírios do Líbano, para que distraia a atenção de Damasco utilizando uma oposição anti-Síria no Líbano, e logo em seguida a desestabilização da Síria com a ajuda da Jordânia e da Turquia. Tudo isto ocorreu respectivamente entre 2005 e 2011. É também o motivo pelo qual se criaram no Líbano a Aliança anti-Síria de 14 de março e o Tribunal Especial para o Líbano (STL).

Como primeiro passo a todo isto o documento de 1996 também pede a derrubada do poder de Saddam Hussein em Bagdá e inclusive alude à balcanização do Iraque e forjar uma aliança estratégica regional contra Damasco que inclua um "Iraque Central" árabe muçulmano sunita. A natureza sectária deste projeto é muito óbvia, bem como seus vínculos com a oposição a uma chamada "lua crescente xiita". O plano trata de fomentar divisões sectárias como um meio para conquistar a Síria e criar um enfrentamento xiita-sunita que se oponha ao Irã e mantenha no poder os monarcas árabes.

Os Estados Unidos iniciaram um reforço naval às costas líbia e libanesa. Faz parte das clássicas táticas de Washington, que as utilizou como uma forma de intimidação e de guerra psicológica contra o Irã, Síria e o Bloco da Resistência. Enquanto Washington se empenha em seu reforço naval, as redes de meios de comunicação dominantes controlados pelos sauditas e clientes árabes dos Estados Unidos se concentram no deslocamento de navios russos à Síria, que se percebe como uma ação contra a OTAN.

Al-Ramtha na Jordânia está sendo utilizado para lançar ataques em Daraa e no território sírio. O ministro do Estado jordano para Assuntos de Meios e Comunicações, Rakan Al-Majali, inclusive admitiu em público e descartou a possibilidade de contrabandear armas. Durante anos, forças jordanas impediram com êxito que armas cheguem aos palestinos da Cisjordânia ocupada por Israel desde o território jordano. Na realidade, Amman está enviando armas à Síria e trabalha pela desestabilização da Síria. Forças jordanas atuam como uma primeira linha de defesa de Israel e os serviços de inteligência jordanos são uma extensão da CIA e do Mossad.

Segundo os meios turcos, a França enviou treinadores militares à Turquia e ao Líbano para capacitar recrutas contra a Síria. Os meios de comunicação libaneses sugerem o mesmo. O chamado Exército Livre da Síria e outras organizações de fachada da OTAN e do CCG também utilizam território turco e jordano para lançar incursões na Síria. O Líbano também utiliza ali para contrabandear embarques de armas para a Síria. Muitas destas armas são na realidade armas que o Pentágono redirigiu secretamente ao Líbano desde o Iraque ocupado pelos anglo-estadunidenses durante a presidência de George W. Bush Jr.

O ministro de Relações Externas francês, Alain Juppé, prometeu ao Conselho Nacional Sírio que se imporá um "cordão humanitário". Uma vez mais, o Conselho Nacional Sírio não é uma entidade independente, e por isso Juppé não fez realmente uma promessa; na realidade foi uma declaração.

Enquanto isso, empresas estrangeiras como Suncor Energy, que foram obrigadas a sair da Líbia, não saíram da Síria. O motivo pelo qual essas empresas ficaram foi apresentado como humanitário, pois administram serviços locais no interior da Síria. Por exemplo, Suncor Energy ajudou a produzir petróleo para a exportação desde a Líbia, mas na Síria produz energia para o consumo local. Na realidade, governos hostis permitem que estas empresas fiquem, pois extraem dinheiro da Síria. Querem impedir que ingresse dinheiro, enquanto querem esvaziar a economia local como catalisador para uma implosão interna na Síria.

Junto com os Estados Unidos e seus aliados da OTAN, o Conselho de Cooperação do Golfo (CCG) está impondo sanções que incluem um fim de todos os voos à Síria. Os Estados do CCG e da Turquia se somaram aos ministérios exteriores dos Estados da OTAN para pedir a seus cidadãos que saiam da Síria. Como o Conselho de Segurança da ONU já não constitui uma rota viável contra a Síria, é possível que o CCG trate de impor uma zona de exclusão aérea sobre a Síria mediante a Liga Árabe.

Turquia: cavalo de Troia da OTAN e entrada ao Oriente Médio

A Turquia esteve presente na reunião da Liga Árabe no Marrocos, que pediu a mudança de regime em Damasco. Ankara esteve fazendo um jogo sujo. Inicialmente, durante o começo da guerra da OTAN contra a Líbia, Ankara pretendeu ser neutro enquanto ajudava o Conselho de Transição em Banghazi. Ao governo turco não interessa a população síria. Ao contrário, as demandas que os funcionários turcos fizeram aos sírios significa que há realpolitik em jogo. Concordando com o CCG, a Turquia exigiu que Damasco reoriente sua política externa e se submeta às demandas de Washington como um novo satélite. Através de uma iniciativa da OTAN, os turcos foram responsáveis pelo recrutamento de combatentes contra os governos da Líbia e da Síria.

Durante vários anos, Ankara tratou sigilosamente de desvincular a Síria do Irã e deslocar a influência iraniana no Oriente Médio. A Turquia esteve trabalhando para promover seu país e sua imagem entre os árabes, mas, ao mesmpo tempo, foi um componente chave dos planos de Washington e da OTAN. Ao mesmo tempo, esteve melhorando suas capacidades militares no Mar Negro e em suas fronteiras com o Irã e a Síria. Seu organismo de investigação e desenvolvimento TUBITAK-SAGE, também anunciou que Ankara iniciará em 2012 a produção em massa de mísseis cruzeiros, que serão montados em sua marinha e que fará entregas de aviões jet militares dos Estados Unidos que poderiam ser utilizados em futuras guerras regionais. A Turquia e a OTAN também concordaram que se melhorem as bases turcas para as tropas da OTAN.

Em setembro de 2011, Ankara se uniu ao projeto de escudo de mísseis de Washington, o que incomodou Moscou e Teerã. O Kremlin reservou seu direito de atacar instalações do escudo de mísseis da OTAN na Europa Oriental, enquanto Teerã se reservou o direito de atacar instalações do escudo de mísseis na Turquia em caso de uma guerra regional. Também houve discussões sobre a implantação de mísseis Iskander na Síria por parte do Kremlin.

Desde junho de 2011, Ankara esteve falando de uma invasão da Síria. Apresentou os planos de invasão como uma missão humanitária para estabelecer uma "zona divisória" e um "corredor humanitário" segundo R2P, enquanto afirma que as manifestações na Síria são um tema regional, e não interior. Em julho de 2011, apesar dos estreitos vínculos econômicos iranianos e turcos, a Guarda Revolucionária Iraniana deixou claro que Teerã apoiará os sírios e preferirá Damasco a Ankara. Em agosto de 2011, Ankara começou a empregar soldados aposentados e unidades de sua reserva militar à fronteira turca-síria. Neste contexto, a presença militar russa também se reforçou no porto de Tartus.

De Damasco a Teerã

Tampouco é simples coincidência que o senador Joseph Lieberman tenha começado a exigir no princípio de 2011 que o Pentágono e a OTAN ataquem a Síria e o Irã. Tampouco é uma coincidência que Teerã se tenha incluído nas recentes sanções impostas pelo governo de Obama a Damasco. Damasco é um objetivo intermediário para atacar o Irã e, em termos mais amplos, debilitar Teerã, Moscou e Pequim na luta pelo controle da massa continental eurasiática. Os Estados Unidos e seus demais aliados estão a ponto de reduzir suas forças no Iraque, mas não querem abandonar a região ou permitir que o Irã crie uma ponte com o Mediterrâneo oriental utilizando o Iraque.

Uma vez que os Estados Unidos saiam do Iraque, haverá um corredor direto entre o Líbano e a Síria com o Irã. Será um pesadelo para Washington e Tel Aviv. Enraizará a dominação regional iraniana e reforçará o Bloco da Resistência, que unirá Irã, Síria, Iraque, Líbano e os palestinos. Tanto Israel como os Estados Unidos sofrerão importantes golpes estratégicos.

A pressão sobre a Síria está diretamente vinculada com a retirada estadunidense do Iraque e aos esforços de Washington para impedir que Teerã consiga outras vantagens geopolíticas. Ao sacar Damasco da equação, Washington e seus aliados esperam criar um revés geoestratégico para o Irã.

Tudo o que Washington faz serve de preparação para a nova realidade geopolítica e uma tentativa de preservar sua posição regional. As forças militares estadunidenses do Iraque na realidade se reposicionarão nos países do CCG no Golfo Pérsico. Kuwait albergará novas unidades de combate planejadas para voltar ao Iraque se a segurança colapsar, como no caso de uma guerra regional ou para enfrentar o Irã e seus aliados em um futuro conflito. Os EUA está ativando agora a denominada "Coalizão dos Moderados" que foi criada sob George W. Bush Jr. E está dirigida contra Irã, Síria e seus aliados regionais.

No dia 23 de novembro de 2011 os turcos firmaram um acordo militar com a Grã Bretanha para estabelecer uma cooperação estratégica e para criar laços militares mais estreitos entre ambos países. Durante uma importante visita de Estado de Abdullah Gül a Londres, o acordo foi firmado pelo secretário de Defesa Phillip Hammond e o chefe adjunto do Estado Maior Geral, Hulusi Akar. O acordo anglo-turco intervém no marco das reuniões que o chefe britânico do Estado de Defesa, o general David Richards, e Liam Fox, o ex-ministro de Defesa britânico acossado pelos escândalos, teve com funcionários israelenses em Tel Aviv. Depois da visita do general Richards a Israel, Ehud Barak visitará a Grã Bretanha e depois o Canadá para efetuar conversações sobre a Síria e seu aliados estratégico iraniano. Dentro deste período os governos britânico e canadense declarariam que estão dispostos à guerra contra a Síria e o Irã.

Londres anunciou que também prepara planos militares para uma guerra contra a Síria e o Irã. Do outro lado do Atlântico, o ministro de Defesa do Canadá, Peter MacKay, provocou ondas de choque em seu país quando fez anúncios beligerantes sobre uma guerra com a Síria e o Irã. Também anunciou que o Canadá vai adquirir uma nova série de jets militares como parte de uma importante compra de armas. Na realidade esses passos foram em grande parte simbólicos, porque Teerã esteve limitando deliberadamente seus vínculos com a Grã Bretanha e o Canadá. Durante meses os iranianos também estiveram avaliando abertamente o corte de seus vínculos com a Grã Bretanha e outros membros da União Europeia.

Os eventos que tem que ver a Síria tem muito mais a ver com a geopolítica do Oriente Médio que só com a Síria. Na Knéset [parlamento] israelense, os eventos na Síria na Síria se vincularam naturalmente com a redução do poder iraniano no Oriente Médio. Tel Aviv esteve preparando para um conflito importante durante vários anos. Isto inclui seus vôos militares de longa distância à Grécia que simulavam um ataque contra o Irã e seu emprego de submarinos com armas nucleares o Golfo Pérsico. Também realizaram seus exercícios "Turning Point" [Mudança radical], que se propõe assegurar a continuação do governo israelense mediante a evacuação e relocalização do gabinete e os funcionários israelenses, incluídos o ministério de finanças israelense, bunkeres secretos em caso de uma guerra.

Durante meia década Washington esteve dirigindo um reforço dos armamentos no Oriente Médio apontando ao Irã e ao Bloco da Resistência. Enviou massivos embarques de armas à Arábia Saudita. Enviou entregas de destruidores de bunkers aos Emirados Árabes Unidos e a Israel, entre outros, enquanto atualizou seu próprio arsenal letal. Os funcionários estadunidenses também começaram a falar abertamente de assassinatos de dirigentes e militares iranianos mediante operações clandestinas. O que o mundo enfrenta é um caminho a uma possível escalada militar que poderia ir muito mais além das fronteiras do Oriente Médio e incluir a Rússia, China e seus aliados. A Guarda Revolucionária também deixou claro que se se provocar um conflito com o Irã, o Líbano, Iraque e os palestinos estarão envolvidos como aliados do Irã.




Fonte: globalresearch.ca

Mahdi Darius Nazemroaya
é sociólogo, escritor, colunista e investigador. Seus trabalhos são editados em uma ampla gama de publicações e foram traduzidas em mais de vinte idiomas. Trabalha atualmente no Instituto de Estudos Interdisciplinares (IIS) e é investigador associado do Centre for Research on Globalization (CRG).
Tradução de Diário Liberdade.

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